Criação de ostras modifica a vida de uma comunidade no Vale do Ribeira. No fundo do galpão da Cooperativa dos Produtores de Ostras (Cooperostra), em Cananéia (SP) –, que dá para o fundo do mar, uma nova remessa de carga chega sempre as quartas e quintas-feiras. E lá que o barqueiro e também cooperado, Osnir Pontes, desembarca as ostras.
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Ele chega geralmente por volta das 11 horas da manhã (por causa da maré baixa) após recolher no “braço do mar” os moluscos, retirados pelos cooperados. “Nem sempre todos mandam. Mas, tem semana que vêm dois barcos cheios”, diz. Ali, elas são recolhidas, separadas, classificadas por tamanhos e lavadas pelo funcionário responsável, Mário Batista Pontes, que há 20 anos trabalha com ostras.
É lá também que o produto passa por uma verdadeira transformação até chegar ao destino, que são restaurantes, bares, hotéis da cidade e até uma grande rede de supermercado, na capital paulista. O trabalho de Mário é árduo, como comprovam as suas cicatrizes em pernas e braços e mãos e pés, provocadas pelas conchas afiadas. E vale o sacrifício. “Hoje a rentabilidade é outra. A idéia da cooperativa era proporcionar uma alternativa de renda aos pescadores artesanais, que viam a escassez do pescado. Mas a produção de ostras foi mais longe e é hoje um negócio estruturado”, diz Pontes, que também é um cooperado.
Hoje, a Cooperostra é uma empresa capaz de colher ostras, fazer o beneficiamento necessário, embarcar a mercadoria e entregar horas depois os animais vivos a clientes de São Paulo. Formada por caiçara e quilombolas, que vivem da pesca artesanal e da coleta racional das ostras do mangue (nome científico, Crassostrea brasiliana), em Cananéia – litoral sul do Estado – a Cooperostra agrega 23 cooperados.
O ostreicultor, Francisco de Sales Coutinho, conhecido como Seu Chico, é um dos administradores da Cooperostra. Ele afirma que após o surgimento da cooperativa a dignidade e a auto-estima, por exercer a profissão de coletor de ostra, voltaram para muitos caiçaras. “Vivia correndo da polícia ambiental e muita gente nós ‘taxava’ por trabalhar no mangue. Era uma vergonha e ninguém queria ter isto com profissão”, recorda. “As ostras são retiradas do mangue de modo racional. Depois as levamos aos viveiros para a engorda, até atingirem o tamanho ideal para a venda”, diz Seu Chico.
Desde criança, ele aprendeu os primeiros segredos da ostreicultura. No entanto, só já adulto é que assimilou as técnicas de confeccionar os tabuleiros (espécie de gaiolas submersas, recheadas com ostras). Só assim, Seu Chico viu suas ostras engordarem com facilidade no estuário (parte de um rio que se encontra em contato com o mar, razão pela qual, sofre a influência das marés e possui tipicamente água salobra) do Mar de Dentro, em Cananéia. “Devido às excelentes condições geográficas e climáticas, as ostras não sofrem nenhuma contaminação do contrário prejudicaria a saúde de quem as consome”, afirma ele.
Anualmente, a Cooperostra chega a comercializar 30 mil dúzias. No verão estes números sobem, em torno de 2 mil dúzias por semana. Neste período de intensa produção, cada cooperado chega a ganhar dois salários mínimos ou mais por mês. “As ostras menores, de cinco a seis centímetros são vendidas para mercados, como São Paulo, a R$ 5,20 a dúzia. Já as maiores, com até 10 centímetros, são vendidas a R$ 9,50 a dúzia”, discrimina o funcionário da Cooperostra. Atualmente, a cooperativa tem uma unidade beneficiadora, onde os moluscos passam por um processo de depuração (autofiltragem das ostras com água esterilizada) num padrão de higiene que qualifica a buscar os mercados mais exigentes.
Mudanças a Perder de Vista
A ostreicultura ganhou força na economia da região, mas nenhum dado econômico pode chamar mais atenção que a mudança que ocorreu na vida das pessoas envolvidas. Eles puderam manter com os viveiros, a produção durante o defeso da ostra (período em que a captura é proibida para não prejudicar a reprodução dos moluscos), que vai de 18 de dezembro a 18 de fevereiro. Até 1997, os coletores de ostra da região não realizavam nenhum tipo de manejo de extração. Não respeitavam o tamanho mínimo de coleta dos moluscos – cinco centímetros – nem o período de reprodução da espécie. “O que fazíamos para sobreviver era ruim para o meio ambiente. Sem conhecimento técnico, modificávamos o habitat natural das ostras e comprometiam a sobrevivência da espécie e, conseqüentemente, a nossa própria sobrevivência”, revela Seu Chico. “Vendíamos as ostras por um preço muito baixo para atravessadores, preços que chegavam a R$ 0,45 a dúzia”.
Até que as famílias começaram a discutir formas de mudar essa situação e, em parceria com a Fundação Florestal de São Paulo, órgão vinculado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente, e pelo Instituto de Pesca, da Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento, fizeram o primeiro viveiro de engorda. “Nós começamos com cada família tendo um tabuleiro experimental. E se não fosse a ostra, nós não teriam sobrevivido”, acredita Seu Chico. “A gente enfrentava muita lama e se cortava nos cascalhos de ostra dentro do mangue. Além de não ter certeza de como seria cada dia”, recorda.
Porém, logo depois veio resultado prático, a organização do grupo permitiu eliminar a venda dos atravessadores, fundaram a cooperativa e aumentaram a remuneração média dos extrativistas. Em conseqüência, ocorreu a diminuição do esforço de coleta, do risco de sobreexploração e a preservação do mangue. Os moluscos bivalves (dotados de duas conchas) desempenham um papel importante na natureza, pois passam a vida filtrando água e retendo alimento – um molusco adulto filtra até oito litros de água por hora. Por isso o paladar é sempre peculiar. “Adequando-se, os criadores viram a produção triplicar”, menciona Seu Chico, que reafirma a qualidade dos seus produtos oferecidos aos consumidores e o irresistível apelo de alimento afrodisíaco fornecido pelas ostras.
Em Prol a Uma Comunidade
Junto ao Seu Chico, quilombolas e alguns caiçaras moradores do município transformaram o projeto em algo produtivo. A Cooperostra conquistou o selo do Serviço de Inspeção Federal, o SIF, que habilita a vender os produtos em qualquer lugar do País, e a apresentação mensal de laudos atestando a qualidade da água e da carne. O manejo passou a ser feito com base em pesquisas sobre a população da espécie e a capacidade máxima de captura, resultando no aumento da produtividade. Outro benefício foi a legalização fiscal, sanitária e ambiental da atividade, que até então era clandestina. “Segundo um levantamento, antes saía daqui 75 mil dúzias por mês de ostra do município de Cananéia, sem nenhum controle com o meio ambiente. Hoje, estes números são quase a metade e o retorno é muito melhor, pois conservamos as pequenas que ficam para a época de reprodução, para povoar o mangue”, comenta Mário Pontes, da Cooperostra.
O lugar agora atrai gente e faz com que os jovens do bairro rural (pois trata-se também de uma Comunidade Remanescente de Quilombo do Mandira, reconhecido pelo Estado, a partir do levantamento feito pelo Instituto de Terras do Estado de São Paulo – ITESP) permaneçam mais tempo na região. “Trabalhar aqui é gratificante. Muitos perceberam nas ostras uma alternativa para continuar aqui, sem precisar sair para a cidade”, afirma Zenildo Teixeira, de 26 anos, que há cinco anos é um cooperado. Ele assim como outros jovens possuem agora renda fixa e a garantia de auto-estima.
Além do reconhecimento, técnicos da Fundação ITESP dão apoio à comercialização das ostras por meio de participação em feiras e eventos, como a Festa da Ostra de Mandira (que acontece anualmente no mês de novembro) e por meio de projetos do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) da CONAB. “O papel do ITESP na comunidade do Mandira além do reconhecimento como quilombola, se baseia no trabalho de promoção de geração de renda, no aspecto sócio-econômico da comunidade”, diz o técnico de desenvolvimento agrário, Valmir Mariano Ribeiro, do ITESP. “Hoje, a comercialização que não está só envolvendo os homens da comunidade, como também as mulheres que ingressaram na confecção de roupas e artesanatos. A maior dificuldade, porém, parece estar na abertura de novos mercados para as ostras. Potencial, para isto eles têm”, diz Ribeiro.
O Caminho das ostras até a mesa
Reprodução
As matrizes que ficam nos tabuleiros fazem a liberação dos gametas nas águas onde ocorre a fecundação e o nascimento das lavras.
Sementes
A metamorfose da lavra em ostra é caracterizada pela formação das conchas. Este processo acontece no mangue. São nestes locais, mais especificamente nas raízes das árvores, que se fixam as cobiçadas ostras nativas.
Engorda
Após serem retiradas do mangue (onde devem estar acima de cinco centímetros) seguem para os viveiros de engorda onde passam entre três e quatro meses se alimentando das microalgas encontradas na água do mar.
Beneficiamento
Excluídas as mortas e as que estão com conchas abertas, classificadas por tamanho, lavadas e depuradas, são embaladas em caixas de papel. A prática favorece mantê-las úmida até o local de destino.
Consumo
Quando vivas são comidas na casca, temperadas com limão. Podem ser cozidas no bafo, assadas na brasa ou gratinadas com queijo.
(Fonte: Revista Rural)
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